Hoje poderia ter sido um dia triste, silencioso. Neste dia haveria uma cama vazia, roupas guardadas, lembranças em fotos. Olhos marejados, alma calada e uma missa como oração. Este poderia ter sido o segundo aniversário não comemorado, mas sentido com uma ausência dolorida.
Entretanto, abri os olhos nesse domingo. Mais uma vez! E em um silêncio sereno pude agradecer a Deus por ter-me preservado a vida. Posso comemorar esse aniversário e dizer que eu recebi o maior presente do mundo todo: minha vida.
Eu sentia uma saudade doída de Deus. Trabalhava, dormia, comia e trabalhava. Meus dias foram resumidos a um aperfeiçoamento profissional, algo louvável, mas que exagerava. E fui me afastando da minha intimidade com o Pai. Ia às missas e me envergonhava por não me sentir totalmente entregue.
Um dia fiz um pedido. Queria estar de volta no colo de Deus, quebrar a barreira que eu mesma construí. Alguns meses depois sofri meu acidente. Entretanto essa não foi a resposta do Senhor. O que aconteceria depois disso foi Sua voz.
É inimaginável que aos 27 anos eu estaria tetraplégica. Impossível ignorar esse detalhe, queria ter dançado no meu aniversário, ter cortado meu bolo e até mesmo ter pulado quando o Brasil fez três gols em cima da Costa do Marfim. Eu que nem gosto de futebol. São tantos detalhes e sinto falta deles várias vezes ao dia.
Nesses momentos eu choro e rezo. Primeiro, dou-me o direito de sentir tal dor. Minha oração seria falsa se eu não admitisse minha fraqueza. E a dor vai se transformando em prece, em um abraço sincero, em um acalanto celestial.
Há um ano, ter celebrado meu aniversário teve um toque de alivio. Pensar que quatro meses antes eu encarei a morte e naquele momento eu comemorava a seqüência da minha vida foi algo simultaneamente assustador e incrível.
Meses se passaram e precisei encarar a nova realidade, cheia de dificuldades. São momentos duros, mas que lapidam. Este ano assoprei as velinhas com fôlego mais forte e pensamento mais claro. Comemorando com mais razão e mais alegria. Afinal, a consciência de como está meu corpo e o que posso fazer por ele está mais definida.
foto: Mamis!
E entre minhas sessões de fisioterapia ouço a voz de Deus. Ela me encoraja, me fortalece e me faz crer que n’Ele tudo posso. E estando mais forte posso ser esse minúsculo instrumento. Como é bom viver, celebrar mais um aniversário sabendo que posso transmitir tão singelamente o amor do Pai. Então passo a entender que não existe um porquê de ter sofrido um grave acidente e sim um para que! Para ser canal da graça!
Confesso que sinto medo pela minha fraqueza. Mas não posso temer, pois eu sei que descanso nas chagas de Cristo. E ainda sei que esta é aquela resposta que pedi a Deus, voltar para Ele é estar envolto na graça. Esse amor cura qualquer limitação!
Louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo! Paz e Bem!